O comício não haveria de decorrer na "ordem" desejada. Os sub-títulos da manchete da edição de 16 de Julho eram bem sinal disso mesmo:
"Chegada dos excursionistas — A contra-manifestação — Apedrejamento á casa do sr. Padilha onde se realisou o comicio e aos comboios que conduziam para Coimbra os excursionistas — Tiros — Arrombamento pela madrugada do dia seguinte 12 do corrente — Outras noticias".
Suficiente para percebermos que a Lousã viveu um domingo de autêntica polvorosa. O comboio especial trouxera cerca de 500 republicanos vindos de Coimbra para assistirem ao comício. Logo no percurso da estação ao Centro Republicano "Progresso", aos vivas aos chefes do Partido Republicano sucederam-se manifestações de apoio à monarquia, estas da autoria de contra-manifestantes.
"… Um desordenado berreiro de vivas á Monarchia, sendo a ultima palavra d'esta phrase, pronunciada pela maior parte d'essa pobre gente, sem a primeira syllaba, dando assim a ideia nitida da consciencia de quem levantava os vivas á Monarchia" — lia-se no jornal lousanense.
Aquando da primeira salva de palmas ao orador, "o nosso illustre conterraneo e talentoso advogado Dr. Fernandes Costa (…) de cá de fora apedrejavam as janellas, partindo muitos vidros, disparando-se alguns tiros de rewolver".
Fernandes Costa conseguiu suster os ânimos exaltados dos republicanos, que pretendiam deixar a sala para, no exterior, tirarem desforço dos monárquicos. De seguida usou da palavra "o dr. Antonio Augusto, parocho de Villa Secca".
"Os desordeiros eram os mesmos que em 1901 trouxeram toda a Louzã inquieta com os seus disturbios e os seus desrespeitos ás auctoridades; com a diferença de que então combatiam a eleição d'uma camara que sustou a venda dos baldios, que foram extorquidos ao livre disfructo dos pobres, recebendo o nosso municipio uma insignificancia por esses terrenos que hoje são propriedade dos abastados, e hoje promovem tumultos para que o pobre povo não oiça como são gastos os dinheiros que annualmente são arrancados á sua miseria, sem que com elles se trate de desenvolver as industrias, o commercio, a agricultura, a fim de evitar a enorme emigração para o Brazil e outros paizes" — acrescentava o "Commercio da Louzã", em prosa inaugurada lembrando uma vez mais o "Programma" enunciado no seu número inaugural:
"É necessario que mais uma vez digamos aos nossos conterraneos que o nosso jornal nascido para tratar dos interesses da comarca, se não affastará do seu programma, apesar das ideias republicanas dos seus directores. Enquanto puder viver será esta a sua linha de conducta, não podendo, morrerá no campo da honra".
Em consequência, prometia-se imparcialidade na descrição dos graves tumultos de domingo. Mas tal como o anúncio da realização do comício vinha prenhe de entrelinhas "republicanas", também a narração dos acontecimentos de domingo não conseguiria esconder a alma republicana dos seus directores.
"Vozearia arruaceira", "malta açulada", "desordenado berreiro", "pobre gente", "inconscientes", eram alguns dos epítetos elencados para classificar os contra-manifestantes.
A inauguração do Centro Republicano da Lousã ficava assim manchada por graves distúrbios, e haveria de constituir tema obrigatório das edições seguintes do "Commercio da Louzã".
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